A crise do @COVID19 e o impacto macroeconómico

Notas para o leitor.

O presente artigo surge na continuação de um outro previamente redigido e que pode ser consultado aqui.

A FEP Junior Consulting numa primeira instância desafiou o Sr. Prof. Doutor Filipe Grilo a explicar os cálculos por detrás do modelo preditivo que tem vindo a partilhar no seu facebook pessoal. Agora, propusemos que partilhasse o seu ponto de vista quanto ao impacto que a Covid-19 poderá ter na economia.

Contexto da crise

Esta crise poderá ser ainda mais grave do que a Crise Financeira Global de 2008/2009. A gravidade desta crise deve-se essencialmente ao facto de ser a primeira crise moderna que afeta simultaneamente a oferta e a procura de bens e serviços. Por um lado, afeta a oferta de bens e serviços porque as pessoas não podem/devem estar juntas a produzir. Ou seja, o factor trabalho não pode ser utilizado de forma eficiente. Há algumas empresas que se adaptaram e colocaram os seus trabalhadores a trabalhar a partir de casa; outras adotaram turnos rotativos para evitar que as pessoas estivessem a partilhar o mesmo espaço físico. Apesar de poder haver alguns ganhos de produtividade com o teletrabalho, a imposição total do horário em teletrabalho (ainda por cima, numa situação em que as outras pessoas do agregado familiar partilham o mesmo espaço) trará necessariamente uma quebra da produtividade.

Por outro lado, esta crise afeta também a procura de bens e serviços porque as pessoas não podem sair livremente das suas casas para consumirem. No estado de emergência atual, sair de casa para consumir bens não essenciais é ilegal; sem estado de emergência, a saída de casa seria feita com receio, levando a que as pessoas consumiriam menos do que seria normal.

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Crise @COVID19. Foto de Romanakr no Pixabay.

Efeitos disruptivos imediatos

Estes dois choques têm efeitos disruptivos imediatos na economia. Se as empresas deixam de poder produzir, 1) vão deixar de poder vender, ficando sem liquidez para pagar salários aos seus funcionários; 2) poderá haver escassez de alguns bens, levando a falhas graves na supply chain, isto é, algumas empresas poderão não ter materiais disponíveis para produzir os seus bens; 3) vão deixar de consumir certos materiais, levando a excesso de algumas matérias-primas e, consequentemente, à redução significativa do preço. Ou seja, resumidamente, o choque na oferta provocou uma falta de liquidez e desequilíbrios em vários mercados (excesso e escassez de bens).

Do lado da procura, se as pessoas deixam de poder consumir, os stocks das empresas aumentam e flui menos dinheiro para as empresas, agravando o problema da liquidez.

 

Efeitos disruptivos a curto-prazo

Assumindo que a curto prazo deixa de existir o COVID, as pessoas poderão voltar a trabalhar livremente. O choque sobre a oferta desaparecerá, mas isso não significa que o choque não vai deixar efeitos permanentes. Haverá empresas, que antes deste choque já estavam frágeis, que vão aproveitar para fechar permanentemente por causa da falta de liquidez. Ainda assim, é de esperar que, deste lado das forças económicas, a recuperação seja rápida.

O problema a curto-prazo vai residir no lado da procura. Como as pessoas deixaram de consumir, menos produção vai levar a menos rendimento (e aumento de desemprego) e todos nos sabemos como é que a redução do rendimento impacta sobre a procura de bens e serviços. E todo este processo vai implicar tempo até voltarmos a poder consumir ao nível que estávamos a consumir antes desta crise. Mas para além dos efeitos “normais” de um choque sobre a procura de bens e serviços, esta crise é particular porque pode deixar outras marcas na procura. Isto é, apesar do vírus desaparecer (como assumi em cima), o receio das pessoas ainda vai ficar presente durante algum tempo. E isso pode vir a provocar uma contração mais duradoura em vários tipos de serviços como, por exemplo, o turismo. Tendo em conta que o nosso crescimento dos últimos anos dependeu quase exclusivamente do setor turístico, nós vamos sentir muito a redução do turismo. Em cima disto, a última vaga do setor turístico em Portugal estava no turismo de luxo, que depende muito das pessoas mais velhas. Como este vírus afeta com mais gravidade estas pessoas, é normal que estas pessoas sintam mais receio e que demorem muito mais tempo a voltar à normalidade.

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Desertificação dos serviços. Foto de Anna Shvets no Pexels.

Soluções para os efeitos disruptivos imediatos

Para minimizar o choque imediato do lado da oferta, a tendência de intervenção tem sido no sentido de aliviar as necessidades de liquidez das empresas, adiando pagamentos de impostos e contribuições para o futuro e propondo um sistema de lay-off. Simplificando, este sistema de lay-off permite às empresas pouparem cerca de cinco sextos dos encargos com os trabalhadores, enquanto estes estão em casa. Quais têm sido os problemas destas medidas? Primeiro, a demora a criar a legislação e os instrumentos necessários para que as empresas possam pedir esses apoios. A cada semana que passa sem a implementação destas medidas, cada vez mais empresas ficam com as suas reservas de liquidez esgotadas. Segundo, nem todas as empresas podem pedir essa ajuda. Esta proposta pressupõe um certo “tipo” de empresa e que tenha verificado uma quebra de 40% da sua receita mensal. Estes dois factores implicam que algumas empresas não vão poder ser ajudadas e poderão desaparecer.

Para minimizar o choque imediato do lado da procura, teremos disponíveis as duas classes de políticas macroeconómicas de estabilização: a política orçamental e a política monetária. Do lado da política monetária, o BCE decidiu aumentar a base monetária através do reforço das políticas de compra de ativos, as chamadas políticas não-convencionais. Com isto, o BCE quer dar liquidez aos bancos a baixo custo para que estes emprestem mais facilmente às empresas e aos particulares. Do lado da política orçamental, o aumento previsível da despesa pública vai tentar minimizar os efeitos negativos deste choque. Apesar do Estado português ter reduzido a dívida pública relativa, ainda está numa posição frágil e qualquer salto significativo no défice poderá implicar desconfiança por parte dos investidores internacionais. É por isso que se tem falado da possibilidade do Coronabonds, que seriam obrigações soberanas emitidas conjuntamente pelos países da Zona Euro. Com esta possibilidade, o Estado português estaria a partilhar o risco com os outros estados europeus que têm mais credibilidade junto dos investidores internacionais, como por exemplo o Estado Alemão.

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Sr. Prof. Doutor Filipe Grilo

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